quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

O anjinho

Quantas vezes ficam a olhar um para o outro, sem dizerem nada.
O anjinho, lá no Céu.
Ele, aqui na Terra.


sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

Sem ti

E de súbito desaba o silêncio.
É um silêncio sem ti,
Sem álamos,
Sem luas.

Só nas minhas mãos
Ouço a música das tuas

Eugénio de Andrade

quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

Feliz Natal

Sameiro - 2010

terça-feira, 20 de dezembro de 2011

Retrato da amizade

Encontrei a amizade neste retrato com alguns anos.
E sorri perante o sorriso que emana da fotografia.
Que uma amizade assim ninguém consegue destruir.

segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

Janelas do meu quarto

Porto - 2006
«Janelas do meu quarto,
Do meu quarto de um dos milhões do mundo que ninguém sabe quem é»
Fernando Pessoa/Álvaro de Campos
(Excerto de Tabacaria)

quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

O gestor do pobre

O Xico ouviu e até se engasgou.
Ia ter um gestor.
Um gestor que garantisse que ele, como pobre, não receberia alimentos em excesso.
O Xico não queria um gestor de pobre, não queria ser um coitado, queria trabalho.

segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

Papoila

Na sua curta existência, as papoilas enchem-nos o coração de beleza.
A mãe natureza é parca no tempo de vida que dá às suas criações.

sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

Adeus Mariete

Adeus querida Mariete.
Obrigado por seres uma grande amiga desde a minha adolescência.
Obrigado por teres amado tanto o meu irmão.
Vão estar os dois juntos em Castro Marim, no mesmo espaço. Que estejam também os dois, assim felizes, no céu.
Até um dia destes querida Mariete.

segunda-feira, 28 de novembro de 2011

A terra abençoada

Era ainda uma criança e já pastoreava o seu pequeno rebanho ali perto do que fora uma terra abençoada, segundo lhe dizia o seu avô (ao qual, também, lhe teriam contado os seus antepassados).
O que ele vira, desde criança, foi uma terra que decaía na exacta medida em que ele avançava na idade e em que os seus dirigentes eram sempre piores do que os anteriores.
Hoje, o que outrora teria sido uma terra abençoada, é agora um conjunto de ruínas materiais e humanas.

domingo, 27 de novembro de 2011

A fé do pescador

Muita aflição sentiu Ti António naquele dia.
Pensou na vida difícil que companheira e os filhos iriam ter.
Foi então que sentiu o seu espírito elevar-se clamando por ajuda.
E o mar revolto transformou-se num mar chão.

quinta-feira, 24 de novembro de 2011

Uma flor para ti

É para ti esta linda flor.

domingo, 20 de novembro de 2011

O telhado de ardósia

Manuel olhou para o telhado de ardósia. Viu apenas um telhado.
Manuel não reparou que todas as placas, apesar de diferentes entre si, se uniam para proteger a casa, sem que nenhuma invejasse o papel da outra, porque todas são indispensáveis.



quarta-feira, 16 de novembro de 2011

Novembro de 1982

Quando o nosso querido amigo te pegou ao colo, num dia frio do mês de Novembro de 1982, terias apenas alguns dias.
Mais tarde serias tu a anichar no teu colo a primeira filha do nosso amigo já feito homem. Tu eras a Madinha querida dessa Princesa linda.
Um dia destes, que os dias correm sem parar, será a menina mais nova do nosso amigo a embalar no colo os teus meninos.
Que a amizade, quando é pura e sai do coração, transmite-se de geração em geração.


quarta-feira, 9 de novembro de 2011

O macaco Artur

A obrigação do homem é voar alto, disse o professor Agostinho da Silva.
O Macaco Artur, na ansia de voar alto como um homem, subiu, subiu, até ficar bem no cimo.
E dali olhou em seu redor e inchou. Sou o maior, pensou.
E desprezou os seus semelhantes, seres inferiores, sem vida, sem sentimentos.
O macaco Artur, na ânsia de brilhar ou de esconder, de si mesmo, um passado pobre, esqueceu-se que a vida são uns anitos mal contados.
Dizem algumas pessoas que o espírito do Macaco Artur vagueia, sem sossego, nas noites mais escuras.

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

A sidra

E foram várias as vezes em que Manuel encheu os copos com a sidra fresca.
Tantas que esquecemos aqueles espíritos antigos, malignos e empedernidos, a habitar em corpos de hoje.

quinta-feira, 3 de novembro de 2011

O dragão de komodo


Dragão de Komodo - Jardim Zoológico de Lisboa - 2011
Muito antes de o homem ter aparecido, já por aqui vivia o dragão de komodo.
Foi contemporâneo dos primeiros homens, das suas carências e do seu espírito de sobrevivência. Do nascimento da ideia de propriedade, de força, de domínio, de poder.
Assistiu ao apogeu e declínio de muitas civilizações e impérios. Sobreviveu a religiões, ideologias e sistemas políticos.
Mas, na realidade, o dragão de komodo, continua igual ao seu antepassado do tempo dos dinossauros. E o homem? O que evoluiu nele?


terça-feira, 1 de novembro de 2011

A senhora do eléctrico

Há mesmo coincidências. No eléctrico 28 encontrei a senhora idosa que um dia destes me falava dos tempos do Salazar. Desta vez, sentei-me ao seu lado e fui-lhe dizendo que o Kim não gostara daquela conversa. Até parecia que estava a fazer a defesa dos tempos difíceis de então.
Ai menino - gostei que ela me tratasse assim - perceberam mal o que eu quis dizer.
O povo sofria muito, trabalhavam de sol a sol, pouco tinha para comer. As votações eram uma farsa.
Mas o que fizeram os políticos que nos têm governado nestes últimos tempos? Sob a capa da democracia conduzem-nos para uma situação tão boa ou pior que a desse tempo. E como se têm governado esses políticos? Algum está numa situação de precaridade?
Eu não tenho medo do Salazar, menino, porque o Salazar está morto. Tenho é medo destes políticos.

quinta-feira, 27 de outubro de 2011

A creche da fábrica

Creche da Vista Alegre
Enquanto o autocarro subia na direcção da Graça, em Lisboa, a senhora idosa, que se sentou ao meu lado na Feira da Ladra, ia falando para ela própria.
Que a vida naquele tempo era difícil, ganhava-se pouco. Mas não era a imoralidade de hoje. Os recursos não eram muitos, os ladrões também não o eram, como são hoje (bastava ver que o Salazar morrera sem qualquer património).
Se não havia dinheiro, havia, pelo menos, solidariedade e respeito por quem trabalhava. As grandes fábricas até tinham creches, refeitórios, bairros.
Não respondi. Que haveria de responder? Se tudo aquilo começava a ser uma verdade para mim.


quarta-feira, 26 de outubro de 2011

A grande tristeza

Acabei de ler «A Cabana».
Um pai que perde a filha de seis anos, assassinada.
Um encontro com Deus, numa cabana, quatro anos depois da «grande tristeza» que não mais deixou de o atormentar.
A surpresa de um Deus bom, que ama os seres humanos.
Mas, também, o compreender que as religiões e a política, mais não são do que más criações do homem, que apenas servem para alguns seres humanos serem superiores à restante humanidade.
Custou-me o pai ter perdoado ao assassino da menina. Mas eu ainda não sei o que é o amor entre os semelhantes.

segunda-feira, 24 de outubro de 2011

Lavradores

Escultura na Chamusca

Lavraram a terra que lhes deu alimento,
Lavraram o corpo que lhes deu os filhos,
Lavraram a vida.

domingo, 23 de outubro de 2011

Um anjinho


A Joana emoldurou este teu desenho, que criaste numa terça feira, depois do ballet.
Sob um céu azul e com um sol sorridente, imaginaste uma menina no campo, com borboletas e  flores e um grande laço no cabelo.
Hoje fiquei a olhar para a moldura.
E vi um anjinho a pairar sobre o campo, sobre o teu catavento, aquele que eu espreito, a ver se roda.
E como ele rodopia na mãozinha que pintaste.

sexta-feira, 21 de outubro de 2011

A despedida

Ontem, quando uma aluna se despediu dos colegas, tão contente, eu fiquei com inveja.
Como era possível tanta alegria, se todos estávamos tristes.
Ia embora. Ia para o Canadá.
E eu pensei que, para mim, era já um pouco tarde.
E imaginei a minha velhice.

O modelo asiático

Quem viu as notícias de hoje, viu dois carros atropelarem uma criança. Sem pararem.
Viu 18 pessoas passarem por essa criança atropelada, sem pararem.
Viu a completa ausência de valores humanos.
Na Ásia, China.
Lembrei-me do modelo que estes políticos defendem para Portugal. Dizia João Salgueiro, há um ou dois dias, que temos de nos aproximar do modelo asiático, onde se ganha um 1/4 do do nosso ordenado (não é o dele) e ainda se poupa 30%.
Na verdade, o que os donos do país defendem são dois modelos: um para eles, baseado na riqueza, em altos padrões de vida; outro, o dos trabalhadores, baseado apenas no necessário para que a fonte de trabalho não morra.
E o que mais doí é que apenas se ouvem as vozes dos donos da quinta e dos seus capatazes.

quinta-feira, 13 de outubro de 2011

Um povo contente e descontente

Manifestação da geração à rasca - 12/03/2011

A «Democracia», ou seja o regime de alternância política, é uma coisa boa.
Quando o povo está farto de um governo do PS, elege um novo Governo, do PSD, que antes de entrar no Governo faz grandes promessas e, quando governa, age de maneira completamente diferente, porque não sabia bem o estado em que se encontrava o País.
Farto novamente, o povo lá vai às urnas, muito contente, de fato domingueiro, eleger um novo governo, agora do PS, que prometeu mundos e fundos, mas que, depois, toma medidas opostas às promessas, porque também não sabia o estado em que o País estava.
Enquanto isso, a riqueza que existe vai ficando na mão de uns poucos e a prole de pobres é cada vez maior.

segunda-feira, 10 de outubro de 2011

O rio da sua vida

Era o seu rio de tanto tempo.
Da meninice, da adolescência, da juventude, da idade adulta.
E que alegria em mostrá-lo, assim, quando a lua substitui o sol e se projecta, tímida, sobre o rio.
Que contentamento lhe inundou o coração.
Fora do rio, corria um mar profundo, com areias movediças, fundões e correntes fortes.
E foi nesse mar tenebroso que o ser, a quem mostrara o seu rio, voltou a entrar.




domingo, 9 de outubro de 2011

Cansaço

Grafitti no Bairro Alto - Lisboa
Fechou os olhos de cansaço e deixou que o fumo do tabaco a inundasse.
E não disse uma só palavra durante o resto da noite.

sexta-feira, 7 de outubro de 2011

A escultura

Com cuidado, porque se poderia partir, mostraste-me a tua escultura de argila, moldada com as tuas mãos. A escultura representando a tua mamã.
A primeira escultura para ambas.
E eu, de mansinho, fotografei a tua obra prima.

O nosso lado mau

O Holocausto - Grafitti no Bairro Alto - Lisboa
O lado mau de Hitler foi uma catástrofe.
E o nosso?
Não tendo a mesma dimensão, não contribuirá para a infelicidade de outros semelhantes?

segunda-feira, 3 de outubro de 2011

Sem abrigo

Olhei-o com certa inveja.
Ele, um sem-abrigo.
Eu, um ser impregnado por esta sociedade em decomposição.
Ele, um rebelde.
Eu, um submisso.
Ele, livre.
Eu, um prisioneiro.
Estive tentado a trocar com ele. Descalçar-me, meter as botas ao pescoço, pegar na mala e ir por aí fora.
Mas, sem o dizer, o sem-abrigo diz-me que não quer a troca. Porque, na realidade, o sem-abrigo sou eu.

domingo, 2 de outubro de 2011

O catavento da menina

Na planta, umas mãos de menina, gravadas por ela própria a tinta cor-de-rosa.
Na palma de uma das mãos o suporte do catavento que um dia lhe ofereci.
E, na cadência das minhas palavras, o catavento girava, tremia, rodava de contentamento.

sexta-feira, 30 de setembro de 2011

O insecto e o girassol


Não sei o que aconteceu.
Se fui eu que fiquei sem asas para voar até ti.
Ou se foste tu que te afastaste para longe.

quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Os figos da piteira

Que os figos da piteira tenham espinhos eu compreendo. A natureza tornou-os tão apetitosos que, se lhes não desse defesas, as piteiras não passariam da primeira geração.
Já os espinhos com que o ser humano se arma, no relacionamento com o seu semelhante, não foram uma dádiva da natureza, foram uma criação do próprio homem.

domingo, 25 de setembro de 2011

Ir à pesca e não pescar

Ir à pesca.
Estar com quem gostamos.
Parar um pouco, sentarmo-nos sobre as rochas do lago.
Sentir ao lado a vida a continuar.
Ouvir o sussurrar da natureza, o cantar das aves.
Sentir a tua presença nos que amaste.
Ir à pesca e não pescar.

sábado, 24 de setembro de 2011

Uma flor no Alentejo

Hoje, no Alentejo, uma flor.
Com pétalas sorridentes.
Transmitindo amor.
Hoje, no Alentejo, uma flor.
Que cada um de nós trouxe no coração.

sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Socorro

Martim Moniz - Lisboa -Placa na Junta de Freguesia do Socorro
Há muitos, muitos anos, tantos que já lhes perdi a conta, uma mulher do povo estava feliz. Tinha trazido a este mundo um bébé.
E o pobre do pequenito, acabado de nascer ali no Socorro, em Lisboa,  apenas sabia chorar.
O miúdo cresceu e foi, também, feliz.
Tal como a mulher do povo que o deu à luz.
Pobres e felizes. E sorridentes, mesmo quando tinham necessidade de deixar correr as lágrimas que lhes inundavam o coração.

quarta-feira, 21 de setembro de 2011

Eu, monstro e homem

Alpiarça - Painel de um prédio
«Monstros e homens lado a lado
Não à margem, mas na própria vida.
Absurdos monstros que circulam
Quase honestamente.
Homens atormentados, divididos, fracos.
Homens fortes, unidos, temperados.»
Como eu me sinto assim, simultaneamente, monstro e homem, como neste belo poema de Alexandre O'neill, postado no blog do meu amigo António-Paulo, http://poemacomtodos.blogspot.com.

terça-feira, 20 de setembro de 2011

Cicciolina e a política

Escultura no Jardim Botânico Tropical em Belém
Li hoje num dos nossos diários que actriz porno italiana, Cicciolina, vai receber uma pensão vitalícia de 39.000 euros anuais.
Não a recebe da sua actividade profissional. Recebe a pensão porque foi deputada numa legislatura de cinco anos.
Sinceramente, vendo o que têm feito os nossos políticos, dos quais o mais recente é o nosso conhecido Alberto João, eu cada vez tenho mais respeito pelas mulheres que se prostituem para ganhar a sua vida.
Tenho, no entanto, de reconhecer que a actividade política é, contudo, a profissão mais bem paga apesar de, contrariamente à profissão de prostituta, não nos trazer prazer nenhum, antes pelo contrário.
E penso, embora só para mim, para que ninguém me ouça, como o ser humano é, ainda, tão atrasado, apesar de tanta evolução na ciência.

segunda-feira, 19 de setembro de 2011

Dia de pesca

17/09/2011 - Pesca no Ciborro
O corpo bem virado para a fundura da barragem, como se esta fosse um prado e ele um cavaleiro.
O olhar atento aos toques de algum peixe.
O chapéu cobrindo os raios intensos do sol.
Mas o seu coração tão triste.
Imaginou que a pesca poderia ser diferente, trazer-lhe uma restea de esperança, quem sabe se o seu espírito os teria acompanhado para aquela que seria a sua primeira pescaria.
Mas, para recordar o dia, apenas umas quantas carpas e achigãs, que tornou a devolver à água.

Servidão

Rio de Onor - 2011
«Pergunto à gente que passa
por que vai de olhos no chão.
Silêncio -- é tudo o que tem
quem vive na servidão.»
Manuel Alegre, Trova do Vento que Passa

quarta-feira, 14 de setembro de 2011

Fruta-pão

2011 - São João de Angolares (São Tomé)
«Chamo-me povo de São Tomé
Eu ando a par e passo com a fruta-pão
O pão de cada dia dos homens.»
Francisco Costa Alegre, Cinzas do Madala

Canoa

2011 - Canoa em São Tomé
«Canoa frágil, à beira da praia,
panos presos na cintura,
uma vela a flutuar...
Caleima, mar em fora,
canoa flutuando por sobre as procelas das águas,
lá vai o barquinho da fome.
Rostos duros de angolares
na luta com o gandu
por sobre a procela das ondas
remando, remando
no mar dos tubarões
p´la fome de cada dia.» 
Alda Espírito Santo, poetisa de S. Tomé e Príncipe (1926-2010)

terça-feira, 13 de setembro de 2011

O mergulhador

2011 - Pescador de São Tomé
O mergulhador dá os primeiros passos na direcção de águas mais profundas nas quais possa caçar o seus peixes.
Leva consigo todo um conjunto de apetrechos, esboços do que mais tarde seria a moderna espingarda de caça submarina.
No final da pescaria trouxe uns peixes-lamina, que hoje não havia muita abundância por ali.
Imaginei-me, com o meu primo Rui, no próximo fim-de-semana, a entrar pela água da barragem, e apanhar à mão a tal carpa grande que nunca quer vir pelo anzol.

domingo, 11 de setembro de 2011

A corrida da vida

2011 - São Tomé
Enquanto a máquina disparava para obter a foto, imaginava a corrida da vida, o homem insaciável, a ânsia do querer sempre mais, mesmo quando a vida está no limiar do fim do ciclo e já não se necessita de mais nada para sobreviver. Fosse outro o modo de viver do ser humano e ela estaria entre nós.
Mas a corrida que eu fotografei não era uma corrida de vida e de morte.
Era a vivência entre o homem e os outros seres filhos da mãe Terra, era o viver da juventude.
Ali bem perto, numa tenda armada junto ao mar, o pastor grita no alto-falante que «morreu hoje o teu velho eu». Fiquei a meditar em como teria de pôr fim à corrida desenfreada que nos atormenta a vida e não nos deixa viver.

Mãe preta

2011 - Escultura num jardim de São Tomé
Hoje foi um dia em que te sentiste muito triste.
Quando passei por esta escultura compreendi porque tens de assumir a felicidade no teu rosto. Sei que é estranho dizer isto, quando te sentes derrotada.
Mas repara que a mãe negra, não podendo ter os dois meninos nos braços, tem de ter muita força para segurar o que está ao colo, para que ele não caia.
E repara como o menino que perdeu o colo da mãe segura a mãozita do mais pequenino, como a dar-lhe força e amparo.
Tu és como a mãe preta, tens de continuar o caminho da vida, para dares vida ao bébé que anichas nos teus braços, sabendo que a memória de felicidade e alegria, que tanto vimos estampados no seu rosto, vai ser transmitida por mãos pequeninas e invisíveis.

sábado, 10 de setembro de 2011

O pescador

2011 - Pescador em São Tomé
Vi-o da varanda do meu quarto, logo pela manhã.
Estaria o Homem a pregar aos peixes do mar, tal como o fizera Santo António, há muitos anos?
Acerquei-me e vi então, que o Homem era um pescador, tal como Jesus, embora este o fosse de homens.
O pescador lançava o fio, com a perícia de muitas gerações. E, pescando ao sentir nos seus dedos, esperava pelo almoço. Que a natureza por aqui é farta, quer no mar, quer na terra.
Embora eu não saiba nada disso. Na mesa apareceu-me um vermelho grelhado acompanhado por banana-pão frita e fruta-pão assada.

quinta-feira, 8 de setembro de 2011

Equador

2011 - Vista da linha do Equador no Ilhéu das Rolas
A noite de amanhã vai ser longa. Mas, quando o dia nascer no equador, estarei lá para sentir o perfume daquela terra abençoada, cheirar o fim da gravana.
Encher os os olhos de natureza, de mar e floresta. E deliciar-me com o concon e fruta pão, preparado por mãos divinas.
Deixar-me ficar pela noite dentro no quintal da D. Tété ou no Pirata.
Ou dar dois dedos de conversa e sentir a candura daquele povo, o ritmo do leve-leve.

terça-feira, 6 de setembro de 2011

O cordão

Alfama
Nunca, como hoje, senti tanto o entrelaçar do poema, da música, da voz, como quem faz um cordão de três fios.
Enquanto se tece esse cordão espiritual eu vou chegando a ti, estejas onde estiveres.

segunda-feira, 5 de setembro de 2011

A raposinha e o lobo

Gerês - Próximo da Portela do Homem

Então, a raposinha depois de se apanhar com as botas que os senhores compraram na feira, foi por esses campos fora, muito contente, com as botas calçadas.
Mas o lobo, que andava por ali perto, viu vir a raposinha e escondeu-se.
- Olá comadre raposa!
- Que susto que me pregaste compadre lobo.
- Mas que lindas botas que trazes. E como te ficam bem.
- Obrigado compadre lobo. Fui eu que as fiz, disse a raposinha cheia de vaidade (e a mentir, claro).
- Foste tu? Não me estás a enganar?
- Claro que não compadre Lobo. Se quiseres também te faço umas, disse a raposinha, já a pensar como haveria de enganar o Lobo.
- Ai como eu gostava de ter uma botas assim. Ando com os pés tão feridos. O que queres para me fazeres umas iguais às tuas?
- Só preciso de três carneiros bem gordos, para a pele vir esticada, disse a raposa já a babar-se com o que iria comer.
....
Hoje, serias tu a corrigir a minha estória e a contar-ma da seguinte maneira.
O anjinho do céu, que antes era a raposinha morta pelo velho grou que já não tinha idade para voar, foi levado por muitos anjinhos à presença do Senhor Deus.
Mas antes de chegar, recebeu tantos beijinhos de anjinhos. Até o menino da Ofélia que tinha partido cedo ali estava para o receber.
O Senhor Deus tomou o anjinho dos céus nos braços e disse-lhe:
- Minha querida, cumpriste o que te era destinado. Enquanto algumas almas terão de regressar vezes sem conta, tu atingiste a perfeição. E eu necessitava de ti aqui a meu lado.
E continuou o Senhor Deus:
- Tal como o lobo perguntou o que necessitavas para fazer as botas, eu pergunto-te o que necessitas para transmitir a tua felicidade, o teu carinho, o teu sorriso, àquelas almas que vivem na terra.
Senhor Deus meu, pedia-te apenas três coisas:
- que dês coragem aos meus pais da terra para que sejam felizes e façam da minha mana uma raposinha feliz;
- que eu possa ser uma bailarina aqui nos céus;
- e que a minha estrelinha fique mesmo por cima da casa dos meus pais. Sabes, a minha mãe fica a dar mama à minha mana raposinha. Mas o meu pai sai sempre até à rua. Ali fuma um cigarro e observa as estrelas. Assim, quando me ver chama a minha mamã.
- Assim será meu anjo do céu. E, então, a menina saiu do pé do Senhor, com todos os anjinhos do céu, todos a dançarem aqueles passos do ballet da Carmen, como no sarau de 2010.

sexta-feira, 2 de setembro de 2011

A raposinha e as botas

Azulejos no Mercado de Santarém
A raposinha, com fome, abriu a boca e... catrapuz. Largou o grou e veio por aí abaixo.
Mas quando a raposinha vem a chegar ao chão ia a passar um carro de bois, carregado de palha. E a raposinha caíu mesmo no meio da palha.
Como os carros de bois andam devarinho, a raposinha teve tempo de acordar antes dos homens darem com ela. E ao acordar, olhou para um lado, olhou para o outro e viu que estava viva.
E, também viu um belíssimo par de botas que os homens tinham comprado na feira. Que ricas botas, pensou. E, quando os homens foram pelas botas, correram a palha toda, mas botas nada. A raposinha tinha-as calçado e fugira com elas para a floresta. Não sabia que mais à frente estava o lobo escondido à sua espera.
...
Como te dizia, para mim a estória não se passou assim.
O grou, que era velho e já não tinha condições para voar, atirou com a raposinha para o meio do chão. A queda foi tão violenta que a raposinha morreu.
Então, aconteceu uma coisa que eu não sabia que era possível, quando te contei a estória.
A raposinha deitada no chão e as raposas todas à volta dela, a chorarem. Ao mesmo tempo, muitos anjinhos desciam à terra e rodeavam a raposa. E, por entre cânticos lindos e suaves (como o Avé Maria das Celtic Woman) levaram a raposinha para os céus. Eu sei que é difícil explicar. Como podia ela estar na terra e ao mesmo tempo ir a caminho dos céus. Mas agora percebes que é possível.
Chegados aos céus vestiram a raposinha toda de um tecido branco, acetinado e uma fada, linda como o sol, com uma varinha de condão, fez nascer-lhe umas asinhas.
E, depois, os anjinhos que a rodeavam disseram-lhe: agora já não és a raposinha. És um anjinho dos céus, como nós.
Anda connosco que o Senhor Deus espera-te para te dar um beijinho.

quarta-feira, 31 de agosto de 2011

O grou e a raposinha

Flamingo, Jardim Zoológico de Lisboa

Um dia, a raposa e o grou foram convidados para um casamento e ficaram na mesma mesa. Quando veio a comida, papas de milho, a raposa que tinha uma grande língua comeu tudo e o grou, coitado, ia bicando, mas só se ouvia o barulho do bico a bater na travessa.
O grou ficou muito triste e disse para consigo: deixa estar raposa que um dia vais ver.
Uns meses mais tarde encontrou a raposa encostada a uma árvore e com muita fome.
- O que tens raposa?
- Há dois dias que não encontro nada para comer!
- Olha, disse o grou, vai haver uma grande festa no céu, com muito comer e muita música. Se quiseres ir comigo, eu levo-te. Agarras-te às minhas penas do rabo e vamos.
Não demorou muito, estavam ambos a caminho do céu. A raposa com a boca bem fechada nas penas do grou e o grou a voar, a voar.
- Olha raposa, não ouves já a música? O que o grou queria era que a raposa abrisse a boca e caísse. Mas a raposa não abriu, para não cair.
Um pouco mais acima, o grou disse: ai que cheirinho a comida. Não te cheira raposa?
Nãoooooooooooooo. A raposa esquecera-se, abriu a boca para dizer não e veio por aí abaixo.
Mas a raposa, que era muita boa, teve uma ajuda. Caiu numa carroça, em cima da palha.
....
Esta é a primeira parte da história da raposa que me contaram quando eu era pequenino e que te contei a ti. Mas como quem conta um conto, acrescenta um ponto, se tivesse de a contar outra vez, dir-te ia que não ouve casamento nenhum, nem vingança. Para mim, a raposinha foi deitada violentamente ao chão porque o grou já estava velho e não devia de voar. Ou então, voava baixinho que, assim, a queda nunca seria grande.